O Repórter

Os primeiros sinais da política externa do novo governo

Por Redação...
11 de janeiro de 2019 às 16:45
Atualizada em 11 de janeiro de 2019 às 16:46
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Por João Alfredo Lopes Nyegray*

O Brasil elegeu Jair Bolsonaro como seu novo presidente. Como manda a Constituição, cabe ao presidente eleito nomear e exonerar ministros, exercer a direção superior da Administração Federal, sancionar leis, manter relações com Estados estrangeiros, celebrar tratados, convenções e atos internacionais, dentre outras atribuições. Ainda que no papel tais competências possam parecer simples, trata-se de um amplo rol de responsabilidades, cuja adequada realização depende de muito mais do que de boa vontade. Depende de uma equipe competente, da disponibilidade de boas informações e da capacidade de compreender os reflexos das decisões para os setores importantes do país e com vistas ao longo prazo. Ufa!

Nesta conjuntura, deve-se ter em mente que nenhum país existe isolado no mundo, e que um bom governo deve considerar os objetivos do país no seu relacionamento com os demais. Quais podem ser esses objetivos? Aumentar as trocas comerciais? Ganhar aliados? Aumentar sua influência pelo mundo? Seja qual for o objetivo internacional de um governo, as relações internacionais servem não apenas para o intercâmbio cultural ou político, mas também econômico. E o intercâmbio econômico favorável depende necessariamente das boas relações políticas.

Nesse ponto, o novo governo iniciou seus passos de forma preocupante, uma vez que as declarações dadas até então desestabilizam os pilares ponderados de longa data construídos pelo Itamaraty. O primeiro ponto de preocupação foram as declarações em relação à China, e seus investimentos no Brasil, que têm sido frequentes em áreas bastante importantes para nós, como no setor de portos e infraestrutura. O país asiático é o destino mais frequente dos produtos brasileiros, sendo nosso maior parceiro comercial. Competir com a China significa competir com um mercado de mais de um bilhão de pessoas, com quase sete vezes a população brasileira. Não se pode arriscar perder tantos clientes num momento em que o Brasil precisa gerar mais negócios, exportar mais e gerar mais empregos. Quanto mais os chineses queiram comprar nossos produtos, melhor para nós. Precisamos ter na China um aliado, não um “ponto neutro”.

Um outro ponto bastante crítico refere-se ao Mercosul. As declarações dadas até então parecem colocar nosso bloco regional em segundo plano. Há quem defenda essa posição, alegando que nossos vizinhos são economicamente muito menores que o Brasil e que, portanto, não devem nos interessar. No entanto, a coisa não é tão simples assim. A Argentina é nosso terceiro maior parceiro comercial, estando à frente da Alemanha. Os argentinos compram de nós muito mais do que nós compramos deles. O Uruguai é destino frequente da internacionalização das empresas brasileiras, e boa parte de seu rebanho bovino e ovino é dos nossos frigoríficos. O Paraguai, graças a sua energia elétrica barata, a seus baixos encargos tributários e trabalhistas, tem crescido a largas percentagens e também atrai investimentos e empresas brasileiras, que conseguem produzir lá mais barato do que aqui.

A sinergia que temos com os nossos vizinhos não pode e não deve ser desprezada. É lógico que o Brasil é a maior economia do Mercosul, e que existem grandes diferenças entre nós e os demais países. Justamente por isso devemos dar ao bloco regional uma certa atenção. O Brasil é não apenas seu fundador, mas seu líder natural. Há uma proposta de acordo com a União Europeia – em negociação há quase vinte anos – que caminha para seu desfecho. Esse acordo comercial será frutífero não apenas para o Brasil, mas para o Mercosul como um bloco, e estimulará as trocas e sinergias comerciais entre seus membros também.

Outra declaração que chamou atenção para as futuras relações internacionais brasileiras refere-se à transferência da embaixada em Israel, de Tel Aviv para Jerusalém, tal qual fez Donald Trump com a embaixada estadunidense em maio deste ano. Esse ponto é bastante complexo por envolver a delicada questão do Oriente Médio e, em particular, as já estremecidas relações entre israelenses e palestinos. Ambos os povos consideram Jerusalém como sua capital e a veem como sagrada. Um tratado firmado por israelenses e palestinos em 1993 propôs deixar a questão de Jerusalém para ser discutida no último passo de um processo de paz.

Israel é um país muito importante e o futuro governo deve esforçar-se para estreitar os laços com o país do Oriente. Hoje, os israelenses possuem tecnologia de ponta em várias áreas, capacidade de investimento internacional e bons projetos de cooperação podem florescer. Do outro lado, estão os países árabes, também bastante importantes para a balança comercial brasileira. Muitas empresas brasileiras da área de carnes e proteínas animais adaptaram suas linhas de produção para seguir as leis religiosas muçulmanas, obedecendo ao Halal. Aproximadamente 6% de tudo o que o Brasil exporta destina-se aos países árabes.

Tal qual ocorre em nossas relações com a China, num momento em que o Brasil precisa gerar negócios e exportar para prosperar e aumentar os níveis de emprego, toda declaração deve ser feita com muito cuidado. As Relações Internacionais são um caleidoscópio de povos, culturas, religiões e costumes. Entender isso é perceber a beleza da diversidade internacional, com a qual devemos construir pontes e harmoniosas relações. Um dos fatores que ajuda a entender o notável crescimento chinês é sua profissionalização em política externa, da qual um dos objetivos é abrir mercados para os produtos chineses. É esse um desafio chave que o novo governo enfrentará. Hoje, o Brasil representa menos de 1,5% do comércio internacional, contra aproximadamente 2% de tudo o que era produzido no mundo em 1950. Ou seja: perdemos para nós mesmos. Como reverter esse quadro? Como aumentar o PIB e o emprego? A resposta a essas questões passa, necessariamente, pelos negócios internacionais que o novo presidente deverá se esforçar para expandir.

*João Alfredo Lopes Nyegray, doutorando em Estratégia, é mestre em Internacionalização, advogado e bacharel em Relações Internacionais. É professor dos cursos de Relações Internacionais, Comércio Exterior, Administração e Economia da Universidade Positivo (UP).

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