O Repórter

Economia forte, trabalho digno!

Por Redação...
24 de fevereiro de 2021 às 11:11
Atualizada em 24 de fevereiro de 2021 às 11:26
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Por Fernando Valente Pimentel*

O novo coronavírus, em contraste com sua invisibilidade a olho nu, escancarou aos olhos da humanidade as fragilidades do mundo, em especial de nações menos favorecidas, que ainda não conquistaram o desenvolvimento em níveis elevados. Os déficits na saúde, organização do Estado, educação, saneamento básico, moradia, infraestrutura, segurança pública e competitividade econômica potencializaram-se, dificultando o controle da doença e causando danos muito graves à sociedade e aos setores produtivos.

Tais reflexões são inevitáveis para os brasileiros por ocasião do Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, transcorrido em 28 de janeiro. Afinal, a pandemia aumentou ainda mais os números de desempregados e desalentados, já muito grandes antes de sua eclosão, que, somados, superam hoje a 20 milhões de pessoas. Grande parte delas, para sua sobrevivência e a de seus dependentes, está subempregada, fazendo bicos e entregue às agruras da informalidade.

Aliás, cabe alertar que, independentemente da pandemia, nosso país tem mais trabalhadores na informalidade do que na formalidade. É pertinente questionar por que isso ocorre, em meio a um cenário global cada vez mais voltado ao compliance em todos os níveis. Por que ainda enfrentamos essa situação, cujos desdobramentos são tão danosos à sociedade? Empregos e/ou empresas na informalidade resultam em menor qualidade no trabalho, produtos e serviços e baixa produtividade, fatores que ferem de modo contundente nosso grau de competitividade.

É preciso criar condições, já considerando as variáveis das relações laborais e os novos modelos de trabalho, como o home office, intensificado na pandemia, para que os negócios emerjam à formalidade e mantenham contratos com seus colaboradores regidos por termos dignos e condizentes com os direitos inerentes à cidadania. Obviamente, num cenário de avanço como esse, haveria redução enorme dos espaços para precarização dos recursos humanos e para o abominável trabalho escravo, que deve ser combatido diuturnamente.

Os problemas laborais ainda presentes no Brasil são quase uma ironia para um país que possui uma das legislações trabalhistas mais rigorosas, complexas e geradoras de insegurança, mas que, em termos práticos, mesmo com a recente reforma, ainda tem um dos maiores volumes de ações judiciais na área em todo o mundo. E, mais ainda, uma nação que não consegue oferecer a parcela expressiva de seu povo a prerrogativa humana do trabalho digno, o meio mais eficaz, correto e justo de distribuição de renda e inclusão socioeconômica.

Tal dívida social decorre de numerosos equívocos acumulados nas últimas décadas, todos eles afunilando na crescente perda de nossa competitividade, sintetizada no "Custo Brasil" e provocada por conhecidas causas, como excesso de impostos e burocracia, desequilíbrio cambial, ondas de juros altos e falta de crédito, insegurança jurídica e baixa produtividade decorrente do ensino precário e informalidade.

Esses fatores, ao longo de anos a fio, apesar de suas grandes dimensões, têm parecido invisíveis, como o novo coronavírus, aos olhos embaçados de um Estado superdimensionado, que serve mais a si próprio e relega a segundo plano as prioridades do crescimento do PIB, educação, saúde, segurança pública, saneamento básico, moradia e infraestrutura. É um setor público que produz leis em excesso, aumentando a complexidade e as incertezas. Nosso arcabouço legal, com as devidas correções de exageros, nos credencia, em tese, a ser protagonistas na agenda global de ESG (sigla do inglês Environmental, Social and Governance), princípios que balizam cada vez mais as relações multi e bilaterais, os investimentos e o ambiente de negócios.

Precisamos, com urgência, tornar nossos ativos legais mais visíveis a nós mesmos, bem como ao mundo, e colocá-los a serviço do desenvolvimento e do crescimento sustentado em patamares de pelo menos 4% ao ano, para recuperar o tempo perdido. Para isso, são prementes as reformas estruturais, como a tributária e administrativa, e a remoção de entulhos legislativos que seguem emperrando nossa competitividade. É preciso, de modo geral, lapidar o conjunto de leis, algumas delas muito boas e avançadas, que rege as relações econômicas e a interação do Estado com os setores produtivos.

Somente assim poderemos comemorar com justa ênfase as datas inerentes ao trabalho digno, que tem vínculo direto com uma economia forte e pressupõe interação sinérgica entre trabalhadores, empregadores e poder público, bem como segurança jurídica para todos, com foco no progresso de cada empresa, setor de atividade e do País.

*Fernando Valente Pimentel é o presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).

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